Fui o rapaz mais feliz do bairro no dia em que a Penélope mudou para casa.
Aconteceu tudo tão depressa. A gente se deu bem logo de cara. Ela começou a vir comer em casa. Estava claro que se sentia bem-vinda e adorava a comida da minha mãe, então refeições conosco viraram um hábito diário.
Ela começou a passar sempre mais tempo em casa. Uma noite, ficou para dormir. E dava para ver que não queria mais ir embora. Ela nunca tinha nos dito exatamente onde morava, nem com quem, mas era óbvio que era mais feliz conosco. E ao que parece, não havia ninguém que se importasse com a Penélope o suficiente para se preocupar quando ela não voltava para a casa dela. Enquanto que eu sim, me importava com ela — e muito.
Então, ela veio morar conosco.
Mas por mais complicada que a situação anterior dela tivesse sido, a Penélope não tinha deixado isso prejudicá-la. Ela era confiante, animada e divertida. A gente adorava fazer as mesmas coisas — ficar deitados no sol, fazer exercício juntos, relaxar no jardim.
Ela também era discreta, bem-educada e simpática. Minha mãe ficava feliz que ela estivesse por ali, e até o antissocial do meu pai gostava dela.
Eu adorava como ela era afetuosa. Sempre que assistíamos TV, ela sentava no sofá encostando em mim. Várias vezes a gente deitava lado a lado na minha cama, e eu passava a mão nela e sentia sua respiração macia. Naquelas horas, nenhum dos dois queria mais nada na vida.
Pelo menos, era o que eu achava.
Apesar disso, era comum ela sair sozinha por horas a fio, às vezes até durante a noite. Eu sabia que ela era forte e capaz de se cuidar, mas era sempre um alívio vê-la de volta no meu quarto quando eu acordava.
Até a manhã em que eu não a vi ali.
Procurei por toda a casa, mas ela não tinha voltado ainda. Talvez só estivesse atrasada, e preparei o desjejum dela como sempre. Mas ao meio-dia ele ainda estava lá, intacto.
Eu não tinha ideia de onde ela tinha ido, então não tinha como contatá-la. Mas tentei não ficar nervoso. Disse para mim mesmo que ela voltaria de tarde — de noite — amanhã.
Dois dias depois, ela continuava desaparecida, e postei uma foto dela no Facebook com um pedido de ajuda. Nosso bairro não era lá muito seguro, e a essa altura eu já estava com medo que alguma coisa ruim tinha acontecido com ela.
Depois de cinco dias de angústia, alguém finalmente contatou meu pai. Tinham visto a Penélope — sã e salva — ali perto, na casa de um parente.
Sã e salva! Fiquei indescritivelmente aliviado — mas também confuso. Por que ela não tinha voltado? Fui até lá, intrigado mas esperançoso.
A família que morava na propriedade foi simpática. Me disseram que sim, a Penélope estava ali, e que eu podia entrar e falar com ela. Percebi que era lá que ela morava antes de me conhecer, e que eles não faziam questão de tê-la ou não ali. Ela tinha a liberdade de viver sua vida como quisesse.
Eu corri ao encontro da Penélope. Tomei-a nos braços, emocionado de vê-la de novo. E ela parecia feliz de me ver — mas só isso. Não vi alívio, arrependimento, nem desejo de voltar para mim.
Eu não conseguia acreditar. Implorei que ela me dissesse o que tinha acontecido. Ela não estava feliz comigo? Em casa, nós todos não a amávamos? Nossos seis meses juntos não significavam nada para ela? Eu tinha feito alguma coisa errada?
Ela não respondeu. Foi carinhosa como sempre, mas enigmática e indecifrável. Nada do que eu dizia parecia tocá-la.
Percebi que aquele era nosso adeus.
Com um nó na garganta, dei-lhe um último abraço, pedi que se cuidasse, e me forcei a ir embora.
Ser deixado por alguém que a gente ama, sem razão evidente e sem explicações, é de partir o coração. Mas acontece, e não há nada que fazer.
Então, conforme eu arrastava os pés pela estrada vazia, solitário e infeliz, tudo o que podia fazer era tentar aceitar. Aceitar o fato incompreensível, mas inegável — minha gata tinha me abandonado.
Por Beatriz Becker